segunda-feira, 31 de outubro de 2011

OS LACRAUS ENCARAM O LOBO



Não deixa de surpreender que uma banda como os Lacraus, o mais letal ferrão roque do ocidente cristianizado, tenha escolhido a designação árabe do animal, ao invés do mui latino “escorpião”. Por outro lado, não surpreende que surpreendam. Nem que regressem. Fica este amargo de boca (e árido de ouvidos) quando damos conta dos anos recentes em que nada escutámos dos Lacraus: fomos nós que hibernámos, não eles. Em boa hora retornamos à sua presença.

Se necessário fosse listar os componentes para um clássico, eis que chegava o disco de receitas mais indicado. Em “Os Lacraus Encaram o Lobo”, as canónicas 12 faixas são ricas em ingredientes, vulcânicas nos temperos, letais nos utensílios, eternas no tempo de cozedura. Aguçando o apetite para os animais cozinhados neste cardápio, temos uma selecção de sangue quente e de sangue sensato. A saber: cães de Constantinopla, gatos do Egipto, corujas amorosas, lobos à porta e lúpus em escritoras. Ainda bichos exóticos saltam da Rua Sésamo para a ementa, quando é atirada aos comensais uma Guiomar em cama de fantoches.

Caso o entaramelar alimentício confunda quem me lê, prometo que o disco funcionará ao contrário. Lacraus são aracnídeos sem teia. Opostos às primas aranhas, desenredam em vez de enredar; não brincam com as vítimas, antes vitimam quem anda a brincar.

Em Portugal, só admito não se tratar do melhor álbum roque do presente se me jurarem que isto não é roque. De facto, muito mais, é um disco com duas tenazes e um ferrão. Uivai, meninos, uivai.

Alinhamento:
OS LACRAUS ENCARAM O LOBO
1 – Um peito em forma de bala
2 – Nessa mesa sento-me de machado
3 – Quando a música acabar em Portugal
4 – Isto não é Lisboa, é Pompeia
5 – Canção para a Flannery O’Connor
6 - Amor-Coruja
7 – Canção para a Alexandra Lencastre
8 – Zero eu, dois República
9 – Condenado a cumprir o Céu
10 – L.A.C.R.A.U.S.
11 – As cabanas do tédio
12 – Filhos da Ressurreição

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