sábado, 25 de agosto de 2007

O OUTRO LADO DA MÚSICA PORTUGUESA




O blog do Santos da Casa iniciou uma rubrica denominada “O Outro Lado da Música Portuguesa”. Pretendemos desta forma dar a conhecer e valorizar o trabalho, de quem na sombra, ajuda os artistas e bandas a alcançarem o estrelato. Por aqui vamos dar voz a promotores, managers, road-managers, rodies, produtores, editores, técnicos de som, donos de salas de concerto, organizadores de espectáculos, realizadores de programas de rádio, jornalistas, e a gente mais ou menos anónima que em sites e blogs fala daquilo que por estes lados se vai produzindo. As grandes entrevistas, com os maiores protagonistas, que são os artistas ficam guardadas para o 107.9 da Rádio Universidade de Coimbra.


Hoje tiramos o retrato ao produtor Paulo Miranda, dono do AmpStudio com sede em Viana do Castelo. O Paulo tem estado intimamente ligado à editora Bor Land tendo o seu nome registado em quase todos os discos da editora do Porto. As obras lançadas por Old Jerusalem têm o seu dedo.
Para lá das mesas e botões o Paulo ocupa o seu tempo criando música. É ele a grande cabeça dos Unplayable Sofa Guitar.


Nome: Paulo Miranda
Idade: 46
Profissão:
Produtor discográfico, Músico
Contactos: www.paulomiranda.eu


1 Santos da Casa (SC) – Como iniciaste a tua actividade de produtor e técnico de som?


PM - A actividade como produtor não teve um "início" como tal. Foi surgindo com um papel cada vez mais interventivo que ia tendo nas gravações que realizava. Sempre que me pedem uma opinião ou uma intervenção criativa em estúdio a minha presença como Produtor torna-se mais definida, mais clara, e por esse motivo foi algo que sucedeu progressivamente e não algo que eu decidisse, do género: "pronto, agora tenho ideias, vou ser Produtor". Aconteceu como evolução natural do que me pedem para fazer. Talvez as minhas ideias e intervenções tenham sido eficazes, daí ter ficado mais conhecido como Produtor.


2 - SC - O facto de seres músico levou-te a seguir esta profissão, ou isto é já um gosto antigo, e uma coisa não está intrinsecamente ligada à outra?


PM - Creio que antes de saber tocar qualquer instrumento ou antes de ter feito a minha primeira música já era mais técnico de som do que músico. Em miúdo, com 8 ou 9 anos de idade, era eu que gravava os "festivais da canção" da criançada dos quintais das trazeiras. E não cantava. Também pegava nos discos que tinha em casa e fazia alinhamentos em cassette, algo como uma Playlist de finais dos anos 60, e quase sempre com discos dos anos 50 que eram os que tinha em casa. Depois, lá para os meus 14 ou 15 anos aprendi a trabalhar com o ferro de soldar e comecei a desmontar rádios, microfones, gravadores, coisas assim; sempre fui mais técnico que músico. Daí até aprender a montar o que desmontava, foi um passo. Fazer música apareceu depois; com o gosto pela electrónica veio o primeiro sintetizador...


3- SC - Qual é no fundo o verdadeiro trabalho de um produtor? Apenas mexer com os botões?


PM - Pode passar por mexer nos botões, mas nos botões certos para cada tema, aqueles que vão dar o “toque” a uma canção, e não necessáriamente aqueles que vão dar o som certo.
No entanto, na maior parte dos casos, o trabalho do Produtor entra mais nos domínios da composição, dos arranjos, da escolha dos instrumentos e dos músicos. Diria que o Produtor deve procurar mais a perfeição da “canção” do que do som e isso requer por vezes rodar alguns botões, mas é muito frequente completar uma produção sem ter de passar para lá das questões artísticas, deixando as questões técnicas de parte.


4 – SC - Quando estás em estúdio com uma banda, só aceitas o trabalho se fores tu a produzir ou se te pedirem apenas para ser técnico isso já te desmotiva?


PM - Aceito trabalho só como técnico, não me desmotiva nada.
Aliás, acontece até haver trabalhos de estúdio em que me pedem uma participação criativa, como Produtor, e que vejo que ficam completos com pouco mais do que o meu trabalho técnico. Não é sempre necessária a orientação de um Produtor, encontro regularmente músicos muito criativos e com uma noção muito clara daquilo que estão a fazer e do que pretendem alcançar. Nesses casos eu próprio deixo a produção fluir como algo não definido, algo que aconteça de uma forma natural como resultado de um trabalho conjunto, meu e dos músicos, em estúdio.
1 – Como iniciaste a tua actividade de produtor 1 – Como iniciaste a tua actividade de produtor


5 - SC - Quando estás em estúdio costumas dar muitos conselhos aos músicos ou se uma banda tiver uma ideia fixa com a qual tu discordas, deixas eles seguirem por essa estrada, mesmo sabendo que o teu nome irá ficar ligado ao trabalho?


PM - Tento sempre deixar a palavra final e a decisão final para os músicos, sobretudo para os autores das músicas. Quando se tratam de opções que se possam reflectir em problemas técnicos (sons com frequências perigosas para uma aparelhagem comum ou efeitos que causem problemas em rádiodifusão, por exemplo) visto a bata de Técnico e aconselho-os ou encaminho-os para uma solução intermédia.
Como Produtor, e uma vez que a minha intervenção criativa pode ir contra a obra original imaginada pelo autor, tento ser conciliador e flexível. Mas sou insistente nas minhas propostas como Produtor.





6 - SC– Revês-te como o produtor da nova geração da música portuguesa?


PM - Não me revejo como Produtor de nenhuma geração. Nem de nenhum estilo musical em particular. Vejo-me mais como um tipo com sorte por ter tido ideias que funcionam e os meios para as pôr em práctica.


7 –SC - Porque será que, já tendo nós por cá bons produtores, não conseguimos encontrar bons masterizadores? O trabalho de masterização é de facto muito importante para o sucesso de um disco?


PM - Há discos bem masterizados em Portugal e gente que faz esse trabalho bem feito. Creio que a preocupação com a Masterização se trata de mais um “hype” temporário.
Na realidade, a preocupação com essa fase da preparação de um album tem sido tanta que muita coisa tem sido completamente “abandalhada” nas fases anteriores (gravação e mistura) a tal ponto que cada vez mais chegam aos estúdios de masterização misturas horríveis de coisas mal gravadas com o objectivo único de serem “salvas” na Masterização.

Nos anos 80 persistia a ideia de que na Mistura se resolviam os problemas da gravação (o Fix-it In the Mix); começou a gravar-se mal e apareceram grandes mesas de mistura, para “salvar” as más gravações. Actualmente, grava-se com uma qualidade péssima, mistura-se “em cima do joelho” com um rato de computador através de colunas de prateleira e leva-se o “lixo” para Masterizar a estúdios carregados de material caríssimo com a esperança única de “salvar” os erros, evitáveis, que se causaram nas fases anteriores. É ridículo.

Os melhores discos que tenho na minha colecção não foram masterizados.


8 - SC - Alguns discos gravados no teu estúdio e aclamados pela crítica como melhores do ano (Old Jerusalem, por exemplo) resultaram assim devido ao grande talento dos artistas, ou sentes que parte do sucesso é também teu?


PM - Creio que em todos os discos que produzi o resultado final é a soma das partes. No caso concreto do Old Jerusalem, a qualidade das canções e das letras, da execução, são só por si uma mais-valia. O trabalho do Old Jerusalem é bom mesmo num gramofone, assumindo que um “produtor” não lhe destrua as canções. Se os resultados obtidos se deveram aos discos própriamente ditos, e ao trabalho total neles contido, aí sim, é a soma do nosso trabalho e dos músicos que participaram. O mesmo direi para discos de outros artistas que produzi.


9 - SC - O que podemos encontrar no AMP Studio?


PM - Um pequeno estúdio de uma só cabine, com material de som comum a qualquer pequeno estúdio. Uma mesa de mistura espanhola, um gravador de bobines com 20 anos, a minha máquina fotográfica e o sofá. O imprescindível sofá. Toda a gente adormece naquele sofá.


10 - SC -
Como analisas o actual momento por que passa a música nacional. Podes responder vestindo a pele de músico e de técnico/produtor?


PM - A música nacional está a passar pelo mesmo momento que as músicas de todo o mundo ocidentalizado. Dificuldade em vender discos, surgimento das edições virtuais em etiquetas online, recurso à internet para promoção, a música a chegar cada vez mais a nichos de mercado e cada vez menos a públicos generalistas, cachets cada vez mais baixos ou inexistentes para concertos em salas pequenas, etc.
Creio que o fenómeno se repete em todo o lado, desde o Japão aos Estados Unidos, passando por Portugal.

Como Produtor e Técnico de som, tendo o meu estúdio a funcionar comercialmente, o que noto cada vez mais é que recebo um número muito maior de trabalhos já gravados, em pistas separadas, só para misturar ou para acrescentar instrumentos adicionais. Cada vez mais música é gravada em casa e muitos músicos recorrem ao estúdio sómente para acrescentar qualquer coisa captada em condições acústicas diferentes das do quarto, sejam elas uma voz ou uma guitarra amplificada.

Também noto que o meu gravador multipistas analógico (de fita) teve mais uso nos últimos dois anos do que nos dez anos anteriores. Tendências...


11 - SC -
5 Discos e 5 bandas nacionais de eleição.



PM
. «Plux Quba» Nuno Canavarro

. «Sanfonia» Realejo

. «7 Heartbeat Tracks» d3ö
. «atsizem» Neon

. «Off Off» Telectu



Nuno Ávila

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