É possível já terem passado seis, sete anos desde que Camané nos brindou com um disco, verdadeiramente, novo?
A voz masculina de referência do fado não esteve ausente dos estúdios neste intervalo. Em 2017 Camané gravou Marceneiro, em 2019 lançou um álbum a meias com Mário Laginha. Mas o último disco seu, só seu, só de reportório seu, foi em 2015, Infinito Presente. E, desde então, o mundo, todo ele composto de mudança, deu muitas voltas.
Agora, a 29 de Outubro, sete anos depois de Infinito Presente, Camané lança um novo álbum de material novo. Chama-se Horas Vazias.
A voz de Camané enriqueceu-se, aperfeiçoou-se, tornou-se mais solta mas também mais funda. Se o norte da sua arte continua a ser “entregar as palavras”, como sempre gostou de dizer - a maneira como a voz transporta e comunica a emoção que se esconde por trás de um poema - em 2021 Camané entrega as palavras como nunca o fez antes.
E que palavras! Amália Rodrigues; Amélia Muge; Maria do Rosário Pedreira; Teresa Muge; David Mourão-Ferreira; Fernando Pessoa; João Monge; Jorge Palma; Júlio Dinis; Pedro Abrunhosa; Sérgio Godinho; Vitorino Salomé. São apenas alguns dos autores cujas palavras Camané entrega em Horas Vazias.
Horas Vazias são 16 novos temas, entre clássicos, inéditos e fados tradicionais. Onde Camané faz suas as “Aves Agoirentas” que Amália gravou no álbum do “Busto”, mas também a “Marcha de Alcântara” criada por Vitorino em 1988. Onde reinventa o Fado Rosa com um poema de Sebastião Cerqueira (“Às Vezes Há um Silêncio”) ou coloca “As Ilhas Afortunadas” de Pessoa no Fado Menor/Maior (dedicado a José Pracana). E onde cria originais de Sérgio Godinho (“O Fado que em Tempos te Cantei”), Jorge Palma (“Noite Transfigurada”), Pedro Abrunhosa (“Que Flor se Abre no Peito”), Amélia Muge (“Se a Solidão Fosse”) ou Carminho (“Nova Vénus”, sobre poema de Júlio Dinis).
Horas Vazias foi gravado com os cúmplices de sempre José Manuel Neto (guitarra portuguesa), Carlos Manuel Proença (viola de fado) e Carlos Bica (contrabaixo). Mas, pela primeira vez, sem o saudoso José Mário Branco aos comandos – embora o ouçamos presente na música inédita que escreveu para o poema de Amália “Tenho Dois Corações”.
Coube a Pedro Moreira, veterano do jazz, a tarefa de produzir e arranjar Horas Vazias, introduzindo pequenas fugas (o saxofone de Ricardo Toscano, o acordeão de João Barradas, um sexteto de cordas) mas nunca se desviando do mapa. Mantendo intactas as coordenadas do que faz de Camané quem ele é: o Fado, ainda e sempre, e as palavras, inteiras, por inteiro.
E a voz. A voz, sem igual, sem comparação. A voz que, por si só, chega para preencher vazios que nem sabíamos que existiam.
Tivemos saudades de ouvir Camané, assim, só ele, só seu. A 29 de Outubro, ele está de volta.
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